Meu irmão Allie era canhoto, e por isso tinha uma luva de beisebol para a mão esquerda.
Nesta luva havia uma porção de poemas escritos em todos os dedos, na cova da luva, por todo canto, em tinta verde.
Ele copiava os poemas na luva porque só assim tinha alguma coisa para ler durante o jogo, quando não havia ninguém arremessando.
Allie agora está morto, teve leucemia e morreu.
Qualquer um teria que gostar dele. Era dois anos mais moço do que eu, mas umas cinquenta vezes mais inteligente.
Os professores estavam sempre escrevendo para minha mãe, dizendo que era um grande prazer ter um menino como o Allie na turma. E não era simples conversa mole, era mesmo pra valer.
O caso é que ele não era só o mais inteligente da família. Era também o melhor de todos, em muitos sentidos.
Nunca ficava aborrecido com ninguém. Dizem que as pessoas de cabelo vermelho estão sempre se irritando com a maior facilidade, mas ele nunca brigava, e tinha o cabelo um bocado vermelho.
Para mostrar como o cabelo dele era vermelho, eu me lembro que uma vez nas férias de verão, quando eu tinha uns 12 anos, estava num campo e, assim sem mais nem menos, tive a impressão de que se me virasse de repente veria o Allie.
Olhei para trás e, batata, lá estava ele sentado na bicicleta, do outro lado da cerca – havia uma cerca que corria em volta de todo o campo – a mais de cem metros, me olhando.
Isso mostra como o cabelo dele era vermelho.
Mas ele era mesmo um bom menino.
Às vezes, na mesa de jantar, lembrava de um troço qualquer e ria tanto que quase caia da cadeira.
Eu só tinha uns treze anos, e meus pais resolveram que eu precisava ser psicanalisado e tudo, porque quebrei todas as janelas da garagem. Mas realmente acho que eles tinham razão.
Dormi na garagem na noite em que ele morreu e quebrei a droga dos vidros todos com a mão, sei lá por quê. Tentei até arrebentar os vidros da camionete que nós tínhamos naquele verão, mas a esta altura minha mão já estava quebrada e tudo, e não consegui.
Reconheço que foi o tipo da coisa estúpida de se fazer, mas eu nem sabia direito o que estava fazendo, e vocês não conheciam o Allie.
Minha mão ainda dói de vez em quando, nos dias de chuva e tudo, e nunca mais consegui fechar direito a mão – assim bem apertada – mas, fora isso, não me importo muito.
De qualquer jeito, sei que não vou mesmo ser um cirurgião, ou um violinista, ou droga nenhuma.
Puta merda, desculpe o termo, mas esta foi a parte que mais me emocionou no livro o APANHADOR NO CAMPO DE CENTEIO.
Não é sem razão que este livro é um clássico, é cult, é lido por assassinos, por estudantes, por profissionais, por crianças, por adultos, por idosos, e todos gostam!!
Gostei do blog, parabéns.
Abraço